Pisando na Bola

BOTAFOGO | SAF | GEOPOLITICA DO FUTEBOL

Antes de mais nada, é sempre bom salientar que o futebol passou por diversas transformações nos últimos 30 anos: algumas ligas ganharam força e outras surgiram. Nesse contexto houve uma mudança radical na estrutura global de mercado.

Há exatos 30 anos, 1992, foi criada a Premier League com uma distribuição mais igualitária dos direitos de TV e 100% igual para direitos internacionais. Desde então, de forma gradual, suprimiu o Cálcio como liga mais forte do mundo, até o ponto que é hoje. Há 20 anos, a Alemanha começou uma reformulação completa em seu futebol, desde a base. Um projeto audacioso que visava transformar a estrutura do seu futebol. Os mais antigos lembrarão do Galvão falando "jogam algo parecido com futebol e dá certo!". Exagero com fundo de verdade.

Desde a criação da PL, NUNCA um técnico inglês ganhou a liga. (Fergurson é escocês, antes que questionem): Culturas futebolisiticas de outros paises foram absorvidas através de técnicos e jogadores. Padrões extracampo e táticos foram criados ajudando o espetaculo. Hoje as duas ligas tem média de gols perto de 3 por jogo, sendo um ponto de perseguição para todas as outras grandes ligas europeias. A CL tem média de 2.75, Ligue1 3.02, La Liga 2.65 e Calcio 2.4. Não a toa o futebol italiano está mais tempo sem chegar em uma final de CL.

Se o futebol mudou muito em 30 anos, nos últimos 10, então, brincadeira. Com padronizações táticas, até gramado, etc. O futebol europeu ficou bem tático e posicional. Desde a base são formados jogadores acostumados a tomar decisões "certas" em campo e responsabilidade tatica. Isso vai a contraponto das nossas bases que formam jogadores mais intuitivos. Os grandes clubes europeus vendo isso começaram a pegar eles cada vez mais jovens para conseguir lapidar da sua forma. Por isso muitos da seleção quase não jogaram aqui. Esses mais jovens 17 a 20anos, muitas vezes são captados pelos clubes finais, que não tem intenção de revenda.

A partir de 21 anos até 24 anos com a diminuição do interesse do primeiro escalão europeu, clubes como Benfica, Porto e Ajax, tentam lapida-los para revenda. Isso foi uma forma encontrada por eles para tentarem diminuir a diferença de receita para grandes ligas, cada vez mais global. Vem, pega o cara com 21, 22 anos, lapida e revende "pronto".

Na última decada os clubes europeus que mais lucraram com venda de jogadores (compra x venda): 1 - Benfica; 2 - Ajax; e, 3 - Porto. Esses clubes tem uma média anual de lucro de R$ 300M. Ajax foi semifinalista da CL há 3 anos, Benfica na ultima chegou as quartas e hoje lidera um grupo com PSG e Juventus este ano. Isso aliado a um trabalho de base para inserir jogadores no mercado. E nenhum clube BR tem essa base, pois a formação é diferente. Lá fora valorizam jogadores com respeito e entendimento tático, foco em futebol, boas decisões em campo e diversas ferramentas que não são desenvolvidas em nossas bases. Acham que precisam lapidar.

A estratégia do Botafogo em médio/longo prazo é pegar essa fatia que hoje pertence a esses clubes que compram aqui por 10M e vendem por 60M..70M. Mas não é um caminho fácil, envolve uma mudança RADICAL de cultura interna e não temos a base para dar suporte. O RBB, por exemplo, investe essencialmente em jovens há 3 anos e ainda não conseguiu vender para um clube grande europeu, nem reforçar o Leipizig, por exemplo. O caminho não é curto e não admite atalhos. Pois além de tudo temos uma diferença de 700M/anual para o rival. Só que o futebol BR está se tornando um porto para os jogadores sul americanos, cada vez mais nosso poder financeiro vem atraindo talentos e tambem quem tem o sonho de ir para a Europa.

Com os novos acordos de TV, um clube BR quase rebaixado terá quase receita do Boca. O Botafogo já sinalizou que quer atrair esses jogadores, inclusive dos EUA. Oferecendo como diferencial uma porta de saída com estudos caso o futebol não vingue para a pessoa e oportunidades europeias, como Belgica, para quem ainda tem chance de desenvolvimento É bem audacioso e com diferenciais claros para oferecer na captação desses atletas pelo continente e BR. Ainda mais com outras SAFs chegando.

No 1º ano o BFR foi ao mercado em contraponto ao que RBB, e outros projetos indicam: investiu em direitos de jogadores acima de 25 anos: Tiquinho, Tche Tche, Victor Sá, Sauer, Cuesta, etc, além de trazermos Eduardo, Marçal, etc. Uma base acima do que vem sendo feito. Um recado claro de quem quer formar 1 jogador de $80M, não 8 de $10M. Pontualmente, não venda em massa. Além disso, fomos em jogadores que em sua grande parte já tiveram contato com o sistema a ser adotado, vindos da europa. Assim, com a evolução natural do estilo de jogo fica mais fácil encaixar jogadores que não tiveram contato. Como é feito em Portugal.  

A médio prazo o Botafogo não quer contratar o De La Cruz no River, ele quer buscar ele no Uruguai e lapidar aqui desde cedo. Como o JT pretende deslocar esses ativos ficará mais claro com o tempo em sua rede multi clubes. O importante é voltarmos ao inicio, a mudança de cultura na PL, Bundesliga, etc.. Hoje o futebol BR é bem reativo, técnicos se contentam com o jogo por uma bola a fim de manter o emprego. Para os clubes, o jogo de amanhã sempre é mais importante que as proximas temporadas. Isso acarreta em dividas, clubes mal administrados, etc. Provavelmente com as SAFs essa mudança de cultura ocorrerá. Projetos de médio/longo prazo serão mais naturais.

O Botafogo esse ano tomou um caminho bem arriscado para ficar 01 ano a frente dos outros. Um caminho de estar na vanguarda de uma mudança cultural com um projeto diferente. Historicamente o antidoto para essas questões taticas europeias sempre vieram daqui: 58 com os 3 minutos que mudaram o futebol (Garrincha x URSS), Copa de 70 x futebol fisico, etc.. E o antidoto pode ser uma base formada com mais conhecimento tático, decisional etc, com aquela pitada BR que encanta, sem a necessidade de venda imediata onde quase castram nossos jogadores. Aqui é um terreno muito mal explorado do ponto de vista comercial. Tirando esses clubes que só buscam lapidar para venda da jogada, o caminho e receitas se abrem. Isso demandará tempo, foco, profissionalismo e a reformulação completa de nossas estruturas de base.

Há margem absurda para crescimento, pois aqui ninguém joga taticamente assim. O 1º que fizer essa revolução desde a base estará anos a frente dos outros, pois é algo que claramente demanda um bom tempo. Um projeto esportivo claro que poucos terão a tranquilidade interna de fazer. Ahh, a média de gols do Brasileirão é perto de 2 por jogo. Vamos juntos!